terça-feira, 9 de outubro de 2012


UM PROGRAMA DE QUALIDADE NA BAIXADA FLUMINENSE

Aquele 22 de julho prometia ser um domingo como outro qualquer, mas quase acabou com a vida de Flávia Rangel Cavalcanti da Silva. A jovem de 23 anos passeava de moto quando sentiu a linha de uma pipa cortar o pescoço e quase decepar o dedo polegar da mão direita. Um ano antes, no dia 12 de março de 2011, Claudionor Ferreira dos Santos, 65 anos, foi atacado pelo vizinho com uma foice no portão de casa. Ao tentar se proteger teve a mão direita quase toda cortada e o polegar esquerdo mutilado. Flávia e Claudionor tiveram o mesmo destino: o Hospital Estadual Adão Pereira Nunes, em Saracuruna, Duque de Caxias. É lá que funciona o S.O.S Reimplante, único programa de cirurgia em amputados do Estado.
 Flávia e Claudionor são dois dos 110 pacientes atendidos pela equipe do médico-cirurgião João Recalde no S.O.S Reimplante em quase três anos. O Programa começou a funcionar oficialmente em novembro de 2009, e o convite do Governo do Estado veio depois que Recalde fez o primeiro reimplante da história da medicina fluminense, em dezembro de 2008. A paciente foi uma menina de nove anos, que morava em um orfanato de Petrópolis, e teve um dos braços amputado em uma máquina de lavar.
 - Esse caso ganhou uma grande repercussão social. Estava em São Paulo com uma equipe e recebemos o pedido do Governador e do Secretário de Saúde, Sérgio Côrtes, para retornarmos ao Rio. Chegamos ao aeroporto Santos Dumont e pegamos o helicóptero que já estava disponibilizado para nos levar ao hospital. Começamos a cirurgia, e seis horas depois, tempo limite, o braço estava reimplantado. Tudo deu certo. Foi a partir daí, desse sucesso, que lançou-se a ideia de oferecer esse serviço à população. Hoje somos o único hospital no Estado que faz esse tipo de cirurgia – afirma Recalde.
 O S.O.S Reimplante faz, em média, de cinco a seis reimplantes por mês. Duas equipes, com cinco profissionais cada, trabalham em estado de sobreaviso e regime de alternância para garantir eficiência ao socorro emergencial. O grupo de atendimento é formado por um microcirurgião, dois assistentes (um cirurgião plástico e um ortopedista), um anestesista e uma instrumentadora.
 - O procedimento de reimplante é feito com microscópio cirúrgico porque as estruturas são muito pequenas. Quando reimplantamos um dedo, precisamos ver qual vaso foi cortado para emendarmos. Só que este vaso tem menos de um milímetro de calibre. A cirurgia repara artérias, veias, nervos, para dar vida novamente aquele segmento que foi amputado e o sangue voltar a circular – explica o cirurgião, que fez, na França, dois anos de especialização em microcirurgia.
 Um presente para Flávia
 O tempo de cicatrização varia de seis a oito semanas. Depois disso, o paciente começa a reabilitação, ou seja, é preciso novamente dar vida e função ao segmento reimplantado. Flávia e Claudionor vão todas às quartas-feiras ao Hospital Adão Pereira Nunes fazer terapia ocupacional.
 - Uma hora depois do meu acidente já entrei no centro cirúrgico. A operação durou seis horas. Desde o primeiro dia, até hoje, continuo sendo muito bem atendida. Fiquei uma semana internada. Este hospital é uma referência e não sabia que era tão bom. Era para eu ter perdido todos os movimentos do meu dedo, que ficou pendurado por uma pele. Os médicos falaram que eu poderia ter morrido. Agora vou comemorar dois aniversários – ressalta Flávia que, após o acidente, ficou sabendo que está grávida. O nascimento do bebê será no mês de março.
 Um outro acidente de moto também foi o responsável pela cirurgia no ombro esquerdo de Wilson Pereira da Silva, que usa um aparelho na mão, denominado órtese, readaptado pelo Dr. Ivens Pereira, terapeuta ocupacional da equipe S.O.S Reimplante. A órtese faz com que os dedos da mão de Wilson ganhem sustentação.







 - Esse aparelho nasceu de uma pesquisa para substituir o antigo, que era considerado pelos pacientes feio, grande e pesado. Junto com uma equipe de estagiários, estudamos toda a biomecânica da mão, e colocamos a órtese mais leve, menor e mais simples. A ideia é substituir temporariamente a função do músculo, que ao ser movimentado, estimula o nervo, até se recuperar totalmente.
 Máquinas de rotação são as vilãs
De acordo com estatísticas feitas pela equipe do Dr. Recalde, 72% dos pacientes atendidos são por acidente de trabalho. As máquinas portáteis de grande rotação, chamadas Makita, lideram a lista de vilões. 
- O Rio precisava ter um serviço dessa qualidade. Todos os países do mundo praticamente disponibilizam uma equipe de reimplante. Com o aumento da industrialização no estado, estamos vendo que o grau de incidência de amputações também vem aumentando de forma alarmante. Foi o momento certo de pensarmos no Programa com o Governo e a Secretaria de Saúde, e um pontapé muito importante para a saúde do Rio de Janeiro.
Médico há mais de 30 anos, Recalde se orgulha do trabalho que desenvolve no Hospital Adão Pereira Nunes, e faz planos para o futuro.
- É um trabalho de grande dedicação. Ninguém vinha para a Baixada Fluminense para fazer reimplante. Ao contrário, as pessoas tinham que ir para a Zona Sul, para os hospitais mais caros. Nós invertemos isso. Hoje em dia trouxemos qualidade, competência e uma especialidade sofisticada para uma parte da população que desprovia completamente de recursos financeiros para fazer uma cirurgia dessas. O caminho agora será criar um grande Centro de trauma de mão. O hospital é referência nessa área e acho que será o fechamento do Programa S.O.S Reimplante para atender pacientes de urgência com equipe especializada. 

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